Quando as pessoas (des)conhecidas passam por nós na rua e perguntam: “Então,
tudo bem?”, na verdade não querem saber a resposta. É uma coisa que se diz. É
como o “vamos beber um café?” que pode ser um chá ou uma outra coisa qualquer,
apenas um pretexto para 10 minutos de conversa. E ainda bem, porque nós também
não queremos responder nem entrar em pormenores, por isso normalmente
respondemos um “tá tudo” meio de esguelha e continuamos a andar, preocupados com
tudo aquilo em que já íamos a pensar. Esse tipo de pergunta irrita-me, mais vale não perguntarem nada. Um dia vou
fazer a experiência. Se um desses (des)conhecidos passasse por mim na rua hoje e
me perguntasse se estava tudo bem, eu parava e sentava-me a desfiar o meu rol de
preocupações, tipo: “Não, pá, nem por isso. Sabes, anda aí uma grande crise, pá.
A vida está cada vez mais cara e os ordenados continuam na mesma. Este mês veio
o acerto da luz, sabes? Foi uma grande pranchada. E apanhámos uma multa de
velocidade. E tivemos de pagar o IVA. E temos a placa eléctrica avariada. E
acendi a luz do corredor e fundi a lâmpada. E deve ter feito curto-circuito
porque desligou as luzes da sala. E agora a box da TV Cabo não se liga, cá para
mim também avariou. E a semana passada o carro não pegava e afinal era a
bateria. E tivemos de pôr uma bateria nova e agora o carro tem de ir à revisão,
pá. Já viste o meu azar? E hoje de manhã calcei as meias com tanta força que se
romperam e o estore do quarto partiu-se e etc. etc.” (mais uma grande lista de
pequenas grandes desgraças que ninguém quer saber a não ser os próprios). É por estas e por outras que as pessoas que perguntam na realidade não querem
saber e as que respondem optam por um “Lá em casa tudo bem”, porque as nossas
pequenas tragédias são só nossas e temos de ser nós a resolvê-las. E porque quem
pergunta também tem essas mesmas tragédias e não está para se solidarizar com as
dos outros. É um bocado como o filme do outro (About a Boy, 2002):
“Marcus: You don’t give a shit about anyone and no one gives a shit about
you! “
“Will: I am an island. I am bloody Ibiza!”
Se não quiserem saber, não perguntem. Há dias em que os nossos maus fígados
podem extrapolar todas as regras do socialmente aceitável (hoje é o dia…) e
ainda acabam os dois sentados no chão a lamentarem-se por terem partido o quadro
do menino da lágrima ou coisa assim. Até sempre. (Publicado a 6 Junho 2013)