Há certas coisas que fazem parte das nossas memórias e que nunca deveriam
sair de lá. Coisas que nos lembramos que eram bestiais e que, vistas à luz dos
dias de hoje, são uma valente desilusão, para não usar um termo pior. No outro dia num dos meus zappings frequentes parei na RTP Memória a
ver um episódio da mítica série portuguesa Duarte e Companhia
(1985-89). Do alto dos meus oito anos aquilo parecia-me muito bem, uma série de
detectives à portuguesa, com humor e com uma heroína feminina, a Joaninha, que
deveria ser um exemplo de vida para todas as mulheres, com a sua coragem e
destreza física. Lembrava-me de tudo, do genérico, do célebre 2CVs, dos nomes dos bons e dos
maus, de tudo! Quase tudo, vá… não me lembrava que aquilo era tão mau. Que os
efeitos especiais eram do mais básico que havia, que as piadas não tinham tanta
piada assim, que o guarda-roupa era medonho e que aquilo espremido não dava
grande coisa. Foi pena, preferia não ter voltado a ver e continuar com aquela
sensação de que era muito bom. Já não é a primeira vez que isto me acontece. Quando era miúda passei horas
da minha vida a jogar Golden Axe (1989) e aquilo era mesmo o tipo de jogo que me
agarrava. Uma missão (salvar a princesa), coisas para ir apanhando pelo caminho,
porrada e andar para a frente. Mais uma vez com uma personagem feminina que eu
adorava, mas que nunca ninguém escolhia porque mesmo nos jogos de computador as
personagens femininas tendencialmente são mais limitadas. Enfim… Por isso quando aqui há tempos vi uma edição adaptada para a PS2 não
hesitei em comprar e saí da loja com o ar mais feliz do mundo, o ar de quem
comprou um tesouro por menos de 10 euros e não disse nada a ninguém. Quando
cheguei a casa até estava nervosa e fui logo experimentar, mas depois de andar
meia hora naquilo, o sentimento de desilusão instalou-se, mais uma vez. Bonecos que só fazem três ou quatro movimentos quando é para andar à porrada
e cenários miseráveis, depois de uma pessoa estar habituada por exemplo a um God
of War, não satisfazem nem correspondem à imagem que eu tinha da coisa. E podia estar aqui a tarde toda nisto, se não tivesse mais em que pensar: as
pastilhas Gorila gigantes, as bombocas, os desenhos animados do Tom Sawyer, os
livros da Anita, o clip do Vitinho, enfim, um sem-número de memórias felizes que
não devem ser remexidas para não corrermos o risco de as estragar. Recordar é viver, dizem, mas há certas coisas que só num determinado contexto
fazem sentido. Ou então fomos nós que mudámos. Até sempre. (Publicado a 30 Maio 2013)
Casa e Mundo. Ou Mundo e Casa. Tanto faz.
Há 1 semana